segunda-feira, janeiro 30, 2006

É teu hálito que mexe as penas do meu chapéu.
São teus olhos que procuro na multidão.
És lindo, lindo, lindo...

sexta-feira, janeiro 27, 2006

Insone

No terraço, a vizinha olha para o céu sempre cinzento da capital (toda noite acaba chateada porque esse céu não consegue ficar preto e esconde as estrelas), enquanto pensa naquela voz.
O feitiço chegou em forma de som, uma voz viril, grave, sábia, capaz de atordoá-la. Uma voz mágica.
A pele reage à lembrança e o cérebro continua a evocar o tom, o sotaque, as palavras, os nomes íntimos que se deram um para o outro quando o mundo não importava e as noites eram quase eternas.
Agora, a distância. E acostumar-se com a nova situação.
Do aparelho de som surgem as notas de "Way to Alhambra" e ela não pode evitar imaginar o encontro, os corpos nus sobre os lençóis escuros, os sussurros, o suor, as respirações entrecortadas, o calor, a humidade. O amor. Tantas vezes sonhou com sua voz ao som dessa música. Tantas vezes imaginou que eram as mãos dele a percorrer seu corpo, com delicadeza, os dedos dele a contar suas marcas de nascença.
E agora, só a distância. Acostumar-se com a nova situação e sonhar.
Neste momento ele acenderia um cigarro. Mas ela não fuma.

segunda-feira, janeiro 23, 2006

É simplesmente isso...

La felicidad
está hecha de cosas pequeñas,
que da vergüenza mirar
al aumento de los lentes de la cordura.
La felicidad
es respirar hondo
y sentir
tu aroma
y el tacto de tu piel
en las yemas de mis dedos.

domingo, janeiro 22, 2006

Continuamos...

Finalmente, fiz as provas ontem. Já estava cansada de estudar-estudar-estudar e fazer conta que estudava o dia todo.
Fiz as provas e pronto! E acho que muito bem, por sinal. Sinto-me orgulhosa e feliz (ok, foram súper-fáceis, foram provas-para-burros-incapazes, admito!! :P).
Agora não tenho excusa para não começar a preparar a prova do dia onze... Uahg... Não sei que sensação predomina em mim, nojo ou medo...
Bom começo de semana para todos :)

sexta-feira, janeiro 20, 2006

Descobrimento

A vizinha gosta de cantar enquanto toma banho. A casa de banho é esse lugar onde ela se despe da vergonha junto da roupa.
A água cai, bem quente, tanto como ela pode agüentar, e ela canta como se ninguém a ouvisse.
Mas não é assim... No andar acima, no braço da torre perpendicular ao dela, ele a ouve, toda manhã. Entre o barulho da água, ele distingue e bebe cada nota.
Mas ela não sabe que ele está a ouvir. Sempre que abre a janela depois do banho para deixar escapar o vapor, vê no terraço do andar acima dela uns dedos encostados no borde de cimento, a tamborilartamborilartamborilar, mas nunca deu atenção.
Até que uma tarde se cruza com ele na escada e ouve ele cantarolar aquela música que ela havia cantado no banho de manhã... E vira a cabeça, confusa, enquanto ele abre a porta e sai à rua, com a música entre os lábios... "Oye la confesión / de mi secreto..."

quinta-feira, janeiro 19, 2006

Outro voyeur

A vizinha sabe que estão a olhar para ela. Bom, não tem a certeza, mas imagina que haja alguém a olhar. Afinal, está rodeada de pessoas, como todos nós.
Uma vez aconteceu, quando ela era mais nova. Morava sozinha num apartamento do bairro mais "beto" da cidade e a janela do seu quarto dava a um pátio grande e ensolarado. Ela estudava lá à noite, de short e camiseta, com a janela aberta por causa do calor danado que invade a capital em maio.
E não sabia que havia alguém a observar... Até que levantou os olhos e o viu.
E lá estava ele, a fumar tranquilamente um cigarro na janela, a olhar como quem assiste TV.
No começo, a vizinha assustou-se... Aquele homem era, pelo menos, vinte anos mais velho do que ela... E ela estava sozinha em casa... Então ele começou a fazer bobagens na janela e a fez rir... Ela esqueceu os medos e riu com aquele desconhecido durante quinze minutos, até que fechou a janela para continuar a estudar.
Então, alguém bateu na porta. E quando ela foi abrir, viu como um envelope se deslizava por baixo da porta. Curiosa, o abriu. Dentro havia uma fotografia de um vaso com flores (que coisa feia, pensou ela) e uma carta, onde aquele homem (quem mais podia ser?) lhe explicava que era fotógrafo e que adoraria conhecê-la. Assinava com seu nome e duas palavras: "pillow talk".
Então, ela assustou-se realmente.
À noite seguinte, a vizinha continuou a estudar como sempre, de janela aberta, short e camiseta, com música e um monte de papéis na mesa. Nem se lembrava daquele homem estranho, até que sentiu um golpe de luz no rosto e olhou para o pátio.
Aquele homem tinha tirado uma foto dela!!! Com o coração a bater feito um tambor, a vizinha fechou a janela, trancou a porta e acendeu todas as luzes da casa.
E veio aquele envelope com uma carta: "se quiseres ver a foto, é só combinar comigo... Linda".
Não é preciso dizer que a vizinha jamais combinou nada com ele... Nem que, simplesmente, fechou a cortina para poder estudar de janela aberta. Nem que não deixou de estudar de short e camiseta nunca.

quarta-feira, janeiro 18, 2006

Reflexão

Marcaram-na com um nome de deusa quando nasceu. Mas ninguém a avisou como é difícil encontrar pessoas devotas nestes dias, neste mundo feito de descrentes e ímpios. E um santuário sem incenso e fieis a orar fica tão vazio...
Mas nunca reclamou. No fim de contas, ela própria é ateia...

domingo, janeiro 15, 2006

Tarde de domingo

A vizinha está sentada no sofá, coberta com uma manta, enquanto o céu cor cinza da capital tenta decidir se chove ou não chove.
Uma das pontas da manta não consegue tapar os dedos do pé, branco e pequeno, e a vizinha encolhe as pernas um pouco, com frio. Sobre o regaço, um livro: "Le Città Invisibili", de Italo Calvino. A vizinha não lê; re-lê esse livro que a acompanhou numa viagem de autocar há muitos anos, quando era mais nova e mais ousada e não tinha medo de amar nem de sofrer.
Enquanto lê, pode sentir o calor do sol no rosto através da janela do autocar, a luz dourada nas páginas e a impaciência dificilmente contida do encontro.
Agora sim, está a chover.
A vizinha levanta-se, abre as cortinas para ver a chuva cair e volta a fazer-se um ninho no sofá, bem tapada e entregue às histórias de mr. Calvino.
A fábula de Armilla é sua preferida, talvez porque foi a primeira que leu, quando era criança. Casualmente, Armilla é uma cidade real da Espanha, mas a vizinha nunca esteve lá e acha improvável que seja a mesma Armilla do conto.
Calvino diz que Armilla é uma cidade incompleta, a meio criar, uma floresta de torneiras, chaves, canos, banheiras, pias e mais canos, abandonada antes de ser terminada quem sabe por que motivo.
Pareceria que ninguém mora lá, principalmente porque não há casas, mas não é assim... Contam os curiosos que às vezes, nessa primeira hora da manhã, quando o sol começa a estender seus olhos pelo mundo, pode ver-se um ombro branquíssimo, a ponta de uns dedos finos no borde duma pia, um seio de mármore... Contam os curiosos que se ouvem risos cristalinos, mulheres a cantarolar músicas desconhecidas e tentadoras, enquanto torneiras se abrem sozinhas e banheiras se enchem d'água . E se rumoreja que a cidade foi tomada pelas ninfas, que adoram a água e consideram sua essa montanha de metal e cerâmica.
E a vizinha sorri e se pergunta se é possível sentir saudades do que nunca conheceu, se sua pele é suficientemente branca e macia como para virar uma ninfa e fugir para uma cidade deserta onde brincar entre as gotas e salpicar o mundo, molhada de alegria, nua e viva.

Na praia

O sangue está a ferver nas minhas veias, a temperatura sobe lentamente e sinto minhas bochechas vermelhas e quentes, o calor escapando da minha pele.
A minha boca curva-se num sorriso enquanto teus dedos roçam os meus. A areia debaixo da minha nuca está fria mas a sensação é agradável. Não preciso olhar-te, porque sei o que estás a sentir. Deitados, contemplamos as estrelas duma noite de verão enquanto o mar canta para nós, infatigável, num sussurro calmo.
Espero o momento em que teus olhos fixem os meus e me beijes até me deixares sem fôlego. Quero teu gosto, teu cheiro, teu calor, o atrito do teu queixo mal barbeado no meu pescoço. Foi isso que pedi àquela estrela fugaz que passou há uns minutos.
O resto, fica à tua escolha.

sexta-feira, janeiro 13, 2006

Superstições

Sexta 13... És supersticioso, vizinho? Aqui o pessoal teme mais as terças 13, sei lá qual o motivo.
Neste meu canto do mundo não há espaço para a superstição... Uma sexta 13 é boa sempre porque depois vem um sábado, e depois um domingo... E domingo é ruim, seja qual for o número que o acompanha, porque atrás dele chega a segunda... E essa é fogo!!
Mmmh... Vamos tomar banho? Banho de sexta, demorado e com água bem bem quente...

quinta-feira, janeiro 12, 2006

Uma aclaração

- Me(Nin)a, que é isso da Vizinha Voyeur? Estás a criar um blog porno?
- EU? Que nada, por que dizes isso? (0_o)
- Pois, parece... Esse nome é um bocado esquisito, não achas?
- Ehm... OK... Vamos a deixar claros alguns conceitos:
1. Que é isso da vizinha? Estou na Espanha e considero que Portugal é meu vizinho. Simples, hem? Estou aqui do lado...
2. Que é isso de voyeur? Mais uma vez: estou na Espanha, que posso fazer além de olhar para vocês?
Também é verdade que não estou a escrever aqui com a esperança de ter muitas visitas. Quero simplesmente ter um espaço onde deixar uma parte de mim quando estiver afim de escrever em português o que me vai na alma.
E se houver alguém do outro lado, ainda melhor... Uma pessoa sozinha não pode ser vizinha de ninguém!

A nova vizinha

Bom dia...
Eu sou essa menina que está a olhar para ti desde a janela.
Eu sou a mulher que bate na tua porta para pedir um pouco de açúcar, de robe laranja e toalha na cabeça.
Eu sou essa mulher que gostas de observar quando pensas que ela não percebe.
Eu sou a mulher que te cumprimenta no elevador ou ao pé da escada, piscando o olho.
Eu sou a mulher cujos saltos ouves toda noite. E sei que me maldizes pelo barulho.
Mas acima de tudo, eu sou essa que está a olhar para ti agora.
Um chá, vizinho/a...?