sexta-feira, março 30, 2007

Óculos novos!!

A vizinha abre o estojo e sorri. São perfeitos. A mistura de branco e preto, a forma dos lentes, o tamanho, o brilho, tudo.
Experimenta-os. Olha-se no espelho. Ensaia uma pose. Outra. Faz beicinho. Mostra os dentes. Retira o cabelo da cara para ver-se melhor.
Ela já sabia que era egocêntrica. Sabia que era fetichista. Agora sente-se egocêntrica, fetichista e convencida.

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Fim

- Achas que deviamos parar com isto?
- Só quando terminarmos.
E o beijou como se quisesse começar de novo.

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terça-feira, março 27, 2007

A menina que olhava as paredes

Em casa dos meus pais havia muitas pinturas. Em parte, é porque minha mãe provem de uma família dedicada à arte... Por isso havia quadros bonitos e feios, clássicos e abstractos, velhos e novos a cubrir as paredes da casa toda.
E já me deram tantos bons momentos... Lembro-me de passar horas, quando era criança, a contemplar aquela enorme paisagem marinha... O barco a tremer entre as ondas, o céu cor de cinza, as águas escuras. E eu a imaginar quem viajava naquele barco, para onde ia e se sentia medo da tempestade que estava quase para começar. Quantas vezes quis saber o que acontecia depois naquela história!
Mas os quadros que mais mexiam (e mexem) comigo eram um casal de pinturas pequenas que já estava na parede quando eu nasci. A primeira representa uma velha a ler um livro, os detalhes desenhados com capricho, com tanto cuidado que até quase se podem ler as palavras das páginas. Era uma bruxa? Uma freira? Uma mulher a rezar? Nunca o soube, mas não consigo esquecer seu olhar cheio de atenção, os dedos tortos pela artrite, o gesto severo dos lábios finos.
No outro quadro há um velho numa gruta, meio escondido entre a bruma. Vestido com roupas compridas, careca, a barba branca, os olhos cansados, parece vir ao nosso encontro para dar quem sabe que mensagem secreta. O fundo, escuro, destaca ainda mais a sabedoria do seu olhar inquietante.
E nunca soube o fim daquelas histórias.

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segunda-feira, março 26, 2007

Mais brutos ainda

Que sensíveis somos quando queremos... Tu podes chamar-me de cadela e eu tenho que entender que esse é teu jeito de expressar uma opinião. Mas se eu te digo que nem sabia que trabalhavas, dizes que estou a chamar-te de parasita e que se é assim que eu penso não vale a pena continuar a conversar.
E depois eu sou a zorra orgulhosa. Ver para crer!!

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quarta-feira, março 21, 2007

Sinceros e brutos

Ontem dei por mim a pensar na delicada fronteira que separa sinceridade e grosseria.
Ainda estou a pensar no assunto, mas acho que não é uma questão de intenções: podemos ser grosseiros sem pretender magoar ninguém. Se calhar tem a ver com graus, graus de brusquedade e de respeito pelo interlocutor.
Não sei. No meu país dizem que quem te ama te fará chorar. Os bons amigos têm esse direito de falar cru pelo nosso bem.
Talvez... Achamos que é sinceridade quando pedimos um conselho e grosseria quando não queriamos uma opinião dessa pessoa...
Hoje ando com o cérebro pouco ágil.

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terça-feira, março 20, 2007

Dorme comigo

Lembro-me... Estávamos deitados na cama a olhar para suas fotos. Tinha um iPod gigante cheio de imagens das noitadas com seus amigos. Fazia-me rir tanto... Era bom estarmos assim, simplesmente a partilhar o momento, sentindo seu calor, seu perfume, enquanto o desejo nascia no fundo do meu cérebro e crescia com uma força que cada vez me custava mais conter.
Encostou a cabeça nas minhas costas para assistir TV. Virei-me e ofereci-lhe a barriga. Acariciei-lhe a cabeça, as orelhas, o pescoço, o queixo, conversando de coisas banais. Deixando passar o tempo. Sentia minha respiração, profunda, profunda, quase um suspiro, e o palpitar do meu coração falsamente tranquilo.
Levantou-se e sorriu com aquele ar metade safado metade anjo que me desarmava.
- Posso te beijar?
- Deves.
E beijou-me. Beijou-me com fome, com ânsia, com sabedoria e com paciência enquanto meu peito, feito um tambor, mal me deixava respirar. Não estávamos com pressa, mas a verdade é que quando quis dar por mim já estava a procurar desesperadamente o zíper da minha camisa e nem conseguia recordar para onde tinha jogado as calças.
Ele não sabe, mais ainda sonho com o tacto da sua pele e seu cheiro, com sua voz grave no meu ouvido e sua saliva na minha boca.

segunda-feira, março 19, 2007

Intersecção

Foi apenas um arrepio a percorrer minha coluna. Então, soube que tinhas chegado. Virei-me. Lá estavas, com o cabelo comprido como eu te recordava, escondido e presente entre a multidão, a procurar um lugar com teus amigos.
Tão perto, tão longe.
Quanto seria? Dez metros? Parecia-me um mundo. E pareceu-me uma eternidade até sentir finalmente teus olhos fixos nos meus.
Connection
Intersection of thoughts
You know what I'm thinking
I've known you since the beginning
We're in a cosmic field were everything has its meaning...

Viro-me de novo. Não quero que eles saibam que estou aqui. Tenho que disfarçar este nervosismo, este regresso à adolescência que me provocaste. Converso com meus amigos e tento esquecer-te, mas não posso.
Seria tão fácil levantar-me e chegar ao pé de ti, agora.
Connection
Intersection of thoughts
You know what I'm dreaming
Your dreams are also appealing
It seems quite clear we both have the same feeling...

Viro-me de novo. Danço até esquecer que no dia seguinte devo voltar ao mundo real, esse do qual tu não fazes parte. Quero perder-te entre a multidão e não sei como. Maldigo o dia em que apaguei o número do teu telemóvel. Não fosse eu uma mulher educada...
Yet we've never met before
Yet I've never looked into your eyes before...


(A música é de Blasted Mechanism, "The Art of Fitting"

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domingo, março 18, 2007

Groupie, eu?

Cheguei ontem da maravilhosa Lisboa (já sei, Phil, devo conhecer melhor o Porto... Estás certo!! Se tudo for bem, ainda antes do verão! :D), onde tive a sorte de ver mais um genial concerto de Blasted Mechanism.
Queria neste post agradecer a malta toda por me aturar e ajudar (oriento-me muito mal, perco-me até no corredor de casa), não só com os caminhos mas com as traduções quando não percebia alguma coisa. Eu, que não sou de mexer-me nos concertos (só fico a olhar para o palco de boca aberta e a cantar), acabei por dançar de olhos fechados, os braços no ar e a alma cheia de uma tranquilidade simplesmente inspiradora. Tanta energia, tantas boas vibrações no ambiente...
Mas faltaste-me tu. E bem que já te tinha pedido para vires comigo. Nem tiveste a decência de inventar uma desculpa, simplesmente não contestaste. Pronto, tu é que sabes. Eu continuo a gostar de ti como sempre, ainda não te livras da espanhola doida.
E vamos deitar, que amanhã devo acordar cedo.

terça-feira, março 06, 2007

Loira daltónica

Hoje fui cortar o cabelo. Minha cabeleireira é tão doida quanto eu, e o mais perigoso é que ainda por cima é criativa. E eu não reclamo nunca. Por isso, quando cheguei, ela começou, muito orgulhosa, a mostrar sua obra a toda as senhoras lá presentes.
- Olhem, não ficou bonita? Olhem as cores!! Rosa e laranja sobre o fundo chocolate!!
Enquanto ela confere que as madeixas continuam no seu lugar e pensa por onde vai cortar, eu lhe falo da mulher que vi hoje no metro. Seu cabelo era um espectáculo: não só pelo tom loiro claro, mas pelos matizes que adquiria dependendo da luz; por momentos parecia prateado ou azul.
Minha cabeleireira, que é doida como eu e muito criativa, diz:
- Mas para isso deviamos descolorar-te o cabelo antes.
- Mas eu não quero essa cor, só gostei do efeito naquela rapariga. Eu nunca pintaria de loira.
Aí ela coloca as mãos na cintura e olha para mim, com as tessouras na mão.
- Como assim, não? Tu já tiveste o cabelo preto, castanho, vermelho, azul, roxo, laranja, rosa e agora vais me dizer que loiro não gostavas? Preconceito, hein?
- Mas eu sou morena, não me ficaria bem...
- Tu, morena? Tu és castanha clara!!
- Mas olha, minhas sobrancelhas são pretas...
- Menina, tu és daltónica. És castanha clara. E loira estavas linda. Ficava-te bem com a cor dos olhos.
Saí dali a pensar se era verdade que não sou morena. Ainda bem que tenho a certeza que sou rapariga, pelo menos. Porque do jeito que ela fala, ainda me convencia também disso!!

segunda-feira, março 05, 2007

Sabedoria

Sascha abanou a cabeça, sorriu e disse:
- A vida é uma questão de fazer balanço. Colocas tudo numa balança, o bom e o mau, e é só pensares o que pesa mais.
- Nele pesa muito mais o mau que o bom, Sasi... - disse a vizinha, mexendo a colher na xícara.
- Então já tens a resposta que procuravas.
- Certo.
- Vamos. Tira do armário o vestido preto e vamos para a festa. Que se lixe.

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